Com o avanço das investigações iniciadas em 2020, focadas inicialmente nas compras sem licitação feitas pela Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá para aquisição de medicamentos utilizados no tratamento de pessoas infectadas pela Covid-19, a Polícia Civil descobriu que foram comprados remédios além do necessário, resultando no vencimento e desperdício de dinheiro público. Outras constatações foram a compra de medicamentos com superfaturamento de até 90% nos preços e a aquisição de remédios que não são utilizados no combate do coronavírus, mas se aproveitando das dispensas de licitação destinadas a compras de insumos voltados para o enfrentamento da pandemia.
Esses detalhes foram repassados nesta quinta-feira (10) pelo delegado Eduardo Botelho, titular da Delegacia Especializada de Combate à Corrupção (Deccor), que conduz as investigações da Operação Overpriced, em conjunto com o Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado (Gaeco). Também nesta quinta-feira foi deflagrada a 2ª fase da Operação, mas não houve cumprimento de mandados judiciais para afastamentos contra os investigados, pois a Prefeitura de Cuiabá se antecipou e exonerou os investigados antes da deflagração da nova etapa da Overpriced.
Dessa forma, a juíza Ana Cristina da Silva Mendes, da 7ª Vara Criminal de Cuiabá, só impôs cautelares que proíbem quatro ex-servidores de frequentarem as dependências da Secretaria Municipal der Saúde e de manter contato com outros servidores da Pasta. “Ficou constatado que houve aquisição de medicação além da necessária possibilitando o seu vencimento. Vamos supor que o consumo mensal de uma certa medicação fosse de cinco caixas por mês, houve aquisição de 20 e isso possibilita o seu vencimento, estou exemplificando, não que seja essa a proporção de aquisição. Houve uma aquisição além do normal, além do consumo mensal possibilitando o seu vencimento. E isso acaba confirmando aquela diligência que foi feita no mês retrasado no estoque de medicação do município onde se verificou uma grande quantidade de medicação vencida”, afirmou o delegado Eduardo Botelho.
Além disso, enfatiza o delegado, “houve aquisição realizada com dispensa de licitação, baseada na justificativa de que essa medicação seria utilizada no combate à pandemia, só que a medicação adquirida em si não é uma medicação utilizada no combate da Covid-19”.
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O delegado não citou os nomes dos remédios adquiridos em excesso ou não relacionados ao tratamento de pessoas infectadas pelo coronavírus. Na primeira fase, a investigação citava a compra de Ivermectina. Agora, segundo ele, os trabalhos investigativos foram ampliados.
“Essa é a segunda questão confirmada. Houve dispensa de licitação para aquisição de medicação utilizada no combate da Covid, mas baseada nessa dispensa foi adquirida medicação que não é utilizada no combate da Covid”, informou Botelho.
Conforme o delegado titular da Deccor, o gestor da Secretaria de Saúde precisa fazer aquisição baseada no consumo mensal de modo a evitar o vencimento antecipado, pois caso contrário “vai estar gastando dinheiro público em vão. Essa foi a segunda constatação”.
O delegado explicou que houve ainda uma terceira constatação baseada em auditorias do Ministério da Saúde, através do Denasus (Departamento Nacional de Auditoria do SUS), de medicação adquirida com sobrepreço . “Teve medicação adquirida com base nessa dispensa que na verdade não era usada no combate da Covid e ainda foi adquirida com sobrepreço de 90%, que é um fato por si só, gravíssimo”, afirmou Eduardo Botelho.
As investigações resultaram na deflagração da 1ª fase da Operação Overpriced em 1º de outubro de 2020 e na exoneração do então secretário municipal de Saúde, Luiz Antônio Pôssas de Carvalho, que foi alvo de uma ordem de afastamento do cargo por 180 dias. No mesmo dia ele foi exonerado e os trabalhos investigativos avançaram com base em documentos e mídias apreendidos, além de oitivas de servidores e empresários.
Sobre o superfarturamento de 90% confirmado em alguns itens o delegado foi questionado se poderia ser explicado pelo aumento dos preços entre uma compra e outra feita algum tempo depois. Ele explicou que quando o gestor vai adquirir os medicamentos precisa fazer uma ata mencionando o preço na época dos fatos, de modo que mesmo com possíveis alterações de preços em compras realizadas em momentos posteriores, esse aumento já está embutido no preço normal de aquisição. “Então, além desse aumento, houve sobrepreço”, afirma Eduardo Botelho.
Sobre as empresas que foram alvos de bloqueios totalizando R$ 2,1 milhões nessa 2ª fase da Operação Overpriced, o delegado Eduardo Botelho explicou que são as mesmas já investigadas na primeira fase, com acréscimo de outras duas que também possuem sede em Cuiabá.
PEDIDOS DE AFASTAMENTOS
A Deccor fez um pedido de afastamento cautelar de servidores, mas entre o período da representação cautelar e a deflagração da operação, eles foram exonerados. “Então, esse pedido de afastamento foi convertido em pedido para que eles não se desloquem, não mantenham contato nenhum com servidores da Secretaria Municipal de Saúde”, esclareceu o delegado.
Apesar de o inquérito estar prestes a ser finalizado, o titular da Deccor informou que ainda existem algumas oitivas pendentes de conclusão e dependendo do que for colhido, novas diligências ou até uma terceira fase da operação poderão ser realizadas.
CPI DOS MEDICAMENTOS VENCIDOS
Na Câmara Municipal de Cuiabá está em andamento a CPI dos Medicamentos vencidos, instalada depois que um grupo de vereadores denunciou a existência de uma grande quantidade de remédios vencidos no Centro de Distribuição de Medicamentos e Insumos de Cuiabá (CDMIC). O fato foi comprovado por auditores do Tribunal de Contas do Estado (TCE-MT).
O delegado Eduardo Botelho foi questionado sobre a investigação na seara política no Legislativo Cuiabá acerca dos medicamentos vencidos e informou que se for convidado ou convocado para prestar esclarecimentos, dará sua contribuição com a CPI. “Irei sim, sem problemas”, disse.