O artista José Carlos Andrade, morador da Vila Roda D’Água, na região do município de Nobres, é o autor de várias pinturas que representam as paisagens mato-grossenses, mais especificamente de Nobres, nas paredes de pousadas da região. Filho de uma pintora, Zeca, como é conhecido, conseguiu superar suas dificuldade e realizar seu sonho. Após alguns reveses da vida hoje ele tem cerca de 5% da visão. Com a ajuda da família ele consegue finalizar suas obras. Sua história é trágica, mas também de superação.
Zeca contou que se mudou para a Vila Roda D’Água para conseguir dar uma vida mais tranquila aos seus filhos.
“A cidade hoje oprime muito então eu quis um lugar de paz e sossego. É certo que a gente vem para um local novo e tem as dificuldades, eu não era um artista, desejo muito ser, mas não me considero um, e por necessidade eu me tornei artista quando o senhor Ademar me ofereceu a oportunidade de ‘borrar’ a parede dele”, conta.
Ademar Rodrigues dos Santos é o presidente do Conselho Municipal de Turismo e proprietário da Estância da Mata, um dos locais onde é possível contemplar as pinturas de Zeca, feitas em paredes dos quartos de hóspedes. Este foi o primeiro local onde Zeca fez uma pintura grande.
“Eu falei ‘se o senhor permitir eu quero fazer isso, porque eu tenho dentro de mim que eu vou conseguir fazer alguma coisa que vai ser um diferencial para nós’. A minha medida de visão na época era entre 5% a 10%, então com isso a capacidade da gente fica limitada, mas com a minha família, eu tenho minha esposa que também é artesã, e ela muito tem me incentivado, muito tem me ajudado, levei até o ponto onde eu posso, os meus trabalhos, e ela vem com a conclusão, na questão de luz, definição, e eu vou orientando ela”, explicou.
Zeca perdeu a visão em um acidente na estrada em 2005. Ele transitava de moto pela BR-163, entre Rondonópolis e Ouro Branco do Sul, quando uma pedra atingiu a viseira do capacete, chegando ao seu olho. Ele sofreu um trauma perfurocortante, descolamento da retina e fez tratamento durante 10 anos.
No entanto este não foi o único problema. Alguns anos após o acidente Zeca sofreu toxoplasmose e glaucoma severo no outro olho, vindo a perder também a visão. Por causa disso sua capacidade de visão ficou em 5%.
Ele começou a pintar depois de seu acidente, por incentivo de sua mãe, que também é pintora.
“Eu, na minha limitação de visão, tive um anseio, uma vontade de procurar entretenimento, ocupação com o meu tempo vago. Eu trabalhava, tinha uma vida totalmente carregada de trabalho, e para mim seria um tédio ficar sem nada o que fazer, após meu acidente. E minha mãe, que é pintora, passava férias com a gente nesta época e ela deu a ideia para eu pegar as tintas e ir pintando. E quando eu comecei a fazer, as pessoas, parece que com dó ou sei lá qual era a intenção, começaram a elogiar”, contou.
Zeca então começou a fazer pequenas pinturas e pegou gosto pelo ofício. Após algum tempo sentiu a vontade de fazer pinturas maiores e começou a pintar paredes da região. Além da Estância da Mata, pinturas de Zeca podem ser contempladas na Estância Cyclo das Águas, também em Nobres.
“Eu pintava poucas coisas, usava lupa e fazia umas pinturas pequenas. Aí eu pensei ‘por que eu não faço uma grande?’, sendo que a pequena é muito mais complexa. Aí foi onde eu iniciei o trabalho de pintar as paredes. Eu falei para o senhor Ademar ‘eu só quero que o senhor me ceda as paredes, eu não vou nem cobrar, isso aqui é para demonstrar a minha capacidade, se agradar a gente prossegue’, e graças a Deus deu certo e hoje em vários locais tem as pinturas e eu acho que vai ter em vários outros”, disse.
Hoje a filha de Zeca também se tornou artista plástica e assim como ele pinta paredes na região. O artista conta que hoje continua com o trabalho para inspirar seus filhos, e quem estiver ao seu redor, para que não desistam quando encontrarem dificuldades.
“Eu tenho vontade de que isso seja para mim uma forma de expressar para os meus filhos e para as pessoas que estão à minha volta, de que a gente não deve cruzar os braços e ficar aí dizendo que a vida é difícil, que é ruim. O homem não conhece sequer 1% da sua capacidade, eu creio isso, porque se o homem conhecesse a capacidade que ele tem no íntimo dele eu acho que o mundo não seria o que ele é hoje. Eu penso assim, que a dificuldade vem para que externe o que a gente carrega dentro”, conta o artista.